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sábado, março 17, 2007
 

GRAMÁTICA APLICADA


São raros os dias em que eu sento pra ver Jornal Hoje. Gosto do Evaristo, gosto da Sandra. Só não gosto das notícias. Acho que isso é relevante, não? Por isso que só assisto às chamadas.

Em compensação, leio o Correio todo dia, tendo o cuidado mental de pular as páginas de Política, Economia e Cotidiano. Afinal, só tem coisa ruim lá: número, gente feia e tendências indecentes.

A bola da vez é a violência no Rio e – em menor escala – em São Paulo. Nas reportagens, os cidadãos aparecem indignados, perguntando até quando assistiremos passivamente à escalada da violência. Bom, poderiam fazer como eu: evitar ler o jornal e ver a TV.

O problema é que a violência está muito perto, perto demais pra ser ignorada. Se ela estivesse lá longe, na favela, no subúrbio, na Ceilândia, apenas, talvez o jornal estaria ocupado com tendências da moda ou a última da Cicarelli. Mas, não. A cabeça decepada do moleque é classe média alta, talvez de família abastada.

Daí, véspera de Carnaval, alguns famosos, ao serem entrevistados, dizem que isso “é uma vergonha, a gente precisa fazer algo.” Alguns acham que comemorar Carnaval é uma ofensa. Até um publicitário fez um anúncio perguntando o que temos que fazer pra acabar com isso.

Essa é uma boa pergunta. Num sistema republicano como nosso, seria papel do Estado e da polícia reprimir e evitar a violência. A gente paga imposto pra isso. O que mais fazer?

Hoje, extraordinariamente, ligo a TV e assisto ao jornal. Vejo uma madame carioca com olhos marejados, usando óculos escuros pra esconder a cara de tristeza.

E AÍ, VEIO A LUZ.

Óbvio! Claro! Elementar. O barbeiro que decepou o moleque, o zarolho que errou na garota do morro, o traficante que abastece as festinhas do filho da madame – todos esses só querem o que a madame tem. Os óculos escuros de grife. O carro do ano. A casa com cerca eletrificada.

Eles querem mais. Querem uma loirinha do shopping. Querem entrar no Shopping. Querem o Nike Shox. Querem ser amigos do cara do Nike Shox. Querem ir ao Mac Donald’s. Querem ser iguais a mim, a você, que tem internet, mp3 player... mas não pra usufruírem. Querem ser como nós pra poderem esnobar os miúdos como eles.

Porque, quando encontramos um deles, fazemos a mesma coisa. Ignoramos, olhamos feio; censuramos a condição dos dentes, da roupa do camarada. Sentimos nojo, às vezes medo. Achamos absurdo virem atrapalhar nosso infinito particular de beleza e tecnologia, o universo artificial ao nosso redor.

O Nike do riquinho não o deixa com os pés no chão de que tênis de 600 reais não é real no mundo do flanelinha. Os óculos da patricinha não a deixam enxergar que a pivete ali não tem nada contra ela. O promoter da festa não liga o fato de que o 'avião' que vendeu o pó pra ele é o mesmo que vai apontar a arma na sua cara. Na verdade, os miseráveis moleques só se perguntam porque eles não podem ser iguais.

Ué, é porque nós não somos iguais. Se me perguntam quem é fulana, começo a descrição pelo emprego que ela tem, pelo carro que ela tem, pela camiseta que ela tem, pelo celular rosinha com câmera que ela tem (sem câmera, você não tem); pelo gel do tênis, pelo número da promoção do Mac Donald’s, pelo colégio onde ela estuda.

Daí, talvez eu emende um “mas ela é legal.”

Pois então. No fim, lembrei que, ao me perguntarem quem é fulana, o que deveria aparecer na resposta é o verbo ‘ser’, não o ‘ter’. Noções básicas de gramática que não são conhecidas no dia a dia. Reprova-se a liberdade, reprova-se a segurança, reprova-se a cidadania, reprova-se a vida.

E nos privamos de conhecer, compreender, talvez amar o semelhante que não é semelhante porque, segundo a mãe da Alana – aquela da bala perdida -, ‘quem mora no morro não tem sonho.’ E, sem os sonhos, vai-se a capacidade de olhar pra nós e se sentirem iguais.

Então, volto à pergunta do publicitário: o que temos que fazer pra acabar com a violência? Talvez pequenos gestos cotidianos, como dar bom dia para ricos e pobres; ser educado com advogados e jardineiros; tratar com carinho abonados e pé-rapados.

Talvez, assim, todos entendam que, por trás de vidros de carros, cercas de casas, óculos escuros, somos seres humanos que não precisam dessas coisas pra sermos seres humanos – iguais a eles.

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Quem nunca viu um filme em que o cara legal, no começo, ajuda um desafortunado; e, no meio do filme, o desafortunado, que na verdade é o bandido, trata o cara legal bem por causa da boa ação feita no início? Há ainda as fábulas em que a donzela trata com carinho a pobre velhinha da rua, que vem a ser uma bruxa – ou uma fada. Obviamente que, no desenrolar, a bruxa/fada vai ajudar de volta a donzela. É mais ou menos por aí.

 
Comments:
Concordo com o que disse sobre o pq que os bandidos são bandidos, mas não acho que uma demostração de "somos iguais' seja suficiente, pois os bandidos, apesar de não pedirem para ser pobres, são bandidos pq querem. Depende mto do caráter do bandido, ou da pessoa(rica ou pobre) que está olhando. Acho que uma pessoa pobre pode fazer coisas boas que façam com que ela passe a ter uma vida melhor, assim como um rico pode perder tudo e ficar pobretão da noite pro dia.
E acho idiota as pessoas que olham com um tipo de preconceito só pq a pessoa está com uma bermuda rasgada ou com o pé encardido e admito que quando era menor eu era assim(não me orgulho disso).
Eu gosto de assistir jornal e levo a sério sim o que eles passam, principalmente em se tratando de violência que apesar de acontecer todos os dias, nota-se uma maior crueldade a cada dia. Mas tbm não sou daquelas pessoas neuróticas com olheiras que não conseguem pregar o olho de noite por medo de ser assaltada ou assassinada a qualquer momento, claro. Mas acho que pra mim faz algum sentido aquela famosa frase: "orai e vigiai".
Eu sei que tenho mania de falar coisa que não tem nada a ver com outra, mas tudo bem né. Deu pra entender o que eu quis dizer(espero que sim).=DD
 
Esse esquema de ajudar pra depois ser ajudado é como o que acontece com o policial bom em Dia de Treinamento...
Acredito que em parte mostrar que somos todos iguais poderia melhorar a situação, mas não ia resolver por completo, porque ainda ia existir a vontade de ganhar dinheiro do jeito mais fácil, doa a quem doer. Certa vez passando pelos canais da tv parei em um programa do sbt com uma menina de 16 anos que alegava que não estudava nem trabalhava porque isso cansava ela e ela era muito sensível. Enquanto existirem pessoas assim vão existir crimes como aquele onde uma mulher matou a outra pra conseguir o emprego dela.
E ainda haverão serial killers, mas isso é outra história...
 
Bom, eu não disse que minha sugestão neste post era infalível e definitiva. Óbvio que várias outras medidas devem ser tomadas.

Mas, leiam bem: eu respondi o que podemos fazer como pessoas. Porque, ainda assim, há a polícia, as escolas, serviço social.

Lu de, esse lance do jornal ficou mal explicado entre nós dois. Acho que daria um excelent post pra eu me explicar, vc concorda?

Gui, meu pai gosta do sistema chinês: roubou, toma tiro; não quer trabalhar, toma tiro também. Que tal?
 
A vida não é filme de sessão da tarde. Outro dia um ex-moleque de rua do Rio, "salvo" por um casal de franceses, que pagou toda a educação do rapaz até a faculdade de Direito roubou toda a grana da ONG em que trabalhava e matou friamente a facadas o casal que acreditou nele. Seria uma exceção? Ou brasileiro honesto é que é?

Mas por acaso estou aqui em casa com três documentários brasileiros muito pertinentes ao tema, que recomendo a quem interessar: "Justiça", "Ônibus 174" e "Notícias de uma guerra particular".
 
Desculpa, Thiago, mas eu não vejo Sessão da Tarde. E nem eu disse isso. Aliás, "é mais ou menos por aí" não significa "é exatamente assim."

Não, eu não acho que as coisas sejam simples ou miraculosas. Mudanças dependem de vários fatores. O que eu tento colocar é que são a partir de coisas pequenas que as grandes mudanças acontecem.

Pelo menos, é mais do que só ficar em casa vendo documentários pertinentes.
 
Aliás, eu tava lembrando dos filmes que eu vi em que rola as situações "boas ações geram boas ações".

Um é "Dia de Treinamento", citado pelo Gui. Excelente exemplo de uma situação muito comum.

O outro é do filme "Gritos do Silêncio", que nunca foi passado na Sessão da Tarde. E mais: o filme é uma história verídica (quase um documentário).

Daí, se vc falar "ah, mas os filmes são estrangeiros"; bom, eu já passei por várias situações em que fui gentil com alguém e me safei de boas, desde apanhar de gangue até conseguir desconto em restaurante.

Hum... talvez minha vida seja uma sessão da tarde e a de outros, documentários cruéis.
 
Vamos com calma, não se apoquente, rapaz... O negócio da sessão da tarde é brincadeira, não se ofenda, por favor!

Na verdade eu não discordo totalmente das suas idéias nesse texto aí. Só estava cumprindo o papel de advogado do diabo, mostrando um outro lado da coisa. Pô, claro que as pessoas devem ser civilizadas e tratar bem quem quer que seja. Isso é civilidade, funciona e tem que existir! O lance dos pequenos gestos... Na Economia dizem muito isso: pense grande e faça pequeno. Eu concordo com você. O que ocorre é que há momentos em que eu sou bem descrente em relação às pessoas...

Quanto aos documentários, eles não são cruéis. São importantes e necessários. Sem desmerecer os filmes citados, que eu não vi, mas cada coisa tem seu espaço.

Quanto à provocação, não vou responder aqui. Isso a gente resolve na saída.
 
Sim, também sou descrente em relação a umas pessoas. Mas, como acho que todos têm seu lado bom, é só a gente saber como ativar este lado bom.

Quanto à sua resposta, Thiago, aprendi duas coisas neste bololog desde quando comecei a escrever:

1. Comunicação via internet é sinônimo de mal-entendido;
2. Quem escreve o que quer, lê o que não quer.

Olhe bem pros lados na hora da saída.
 
Olhar bem pros lados?! Ou pra trás?

Eu sei que você atacava os garotos pelas costas e saía correndo pra não apanhar... Tsc, tsc, tsc...
 
cuidado makoto, o thiago pode acabar jogando uma manga nas suas petcha.

ah, e tem tambem aquele lance mal explicado entre voces dois no futebol... ouvi falar que foi por causa de mulher!

ihhhhhhh, vai deixar!?!?!?!?!
 
Pois é...

Thiago esqueceu que eu tenho uma entrada no joelho dele de crédito... e ainda fica enchendo meu saco aqui.

Já aleijei pessoas por menos.
 
Hahahahahahaha!!!! Gaúcho semeando a discórdia!

A violência tomou conta de todos...

Não me façam botar meus "amigos" pra resolver essa parada!!
 
É...eu gosto de assistir não só o jornal hoje,como o jornal nacional.-o último quando falto cursinho =p -
Mas eu apenas assisto e penso:'Que coisa,não? é foda mesmo...'
Desligo a tvê e não lembro de violência o resto do dia.
E nunca parei pra pensar em algo que eu possa fazer para reverter ou melhorar a situação.
Lembrei-me que a gente só assusta com alguma coisa quando ela nos atinge diretamente,ou alguém próximo.
Valadares é uma cidade de médio porte onde assassinatos são freqüentes.Basta folear o jornal daqui ..
Houve uma vez,um sequestro que culminou no assassinato brutal de uma adolescente,que estudava no colégio mais bem visto da cidade.
Foi terrível.Todos ficaram abalados,mas...passou. Hoje em dia não se fala mais nisso. Oo
e soluções realmente não são nunca propostas.
Bem, acho que a sociedade deve oferecer oportunidades às pessoas menos favorecidas,para que todos sejamos iguais.Cabe a pessoa deicidir se ela vai abraçar a oportunidade ou deixar passar...a vida do crime,querendo ou não é mais fácil,né..
Quanto a tratar bem e sem distinção todas as pessoas,acho isso básico! julgar uma pessoa pelo que ela tem é a maior bobagem que podemos fazer...fácil notar um um pobretão que tem uma experiência de vida impressionante, e vale o contrário,o máné que tem dinheiro,mas burro que dói. XD
Temos um projeto em Gv que abre as escolas no sábado,o dia inteiro, para tirar crianças e jovens carentes das ruas.Chama-se : Escola cidadã.São oferecidas aulas de dança,teatro,esporte,artes.Atividades que trablham valores, como respeito ao outro,trabalhar em conjunto,etc.É uma boa coisa que está sendo feita...=) e acredito que dê resultados. Aliás,educação e cultura é tudo.(y)
Enfim,quanto ao comentário final, me lembrei da fácula do leão e do ratinho que vc deve conhecer, e de um filme que tem menos a ver, mas que trata de como pequenos 'favores' e ações pessoais acabam significando muito:'A corrente do bem'.
Oxe,tirei o atraso do tempoq ue fiquei sem comentar aqui,hein? xD

ps:Acho que fugi um pouco do que inicialmente vc quis trasmitir com o post,mas ah! eu sou assim mesmo,que fazer? =/

=***
 
corrente do bem é massa=)
só n gosto do final=\
 
Guim é emo...


O fim do filme é legal, mas o molequinho morre... daí, o Guim chora.
 
Tem mais de um Guim?

pq o dai de cima nao sou eu (nao consigo usar tantas carinhas)
Uma por mensagem eh suficiente.
:)
 
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Nome:
Local: Brasília, Distrito Federal, Brazil

Ué, achei que já tinha respondido a esta pergunta... msn: nemchama@hotmail.com

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